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Farol do caos
Leuchtturm des Chaos (versão original) / Pharos of Chaos (versão internacional) Wolf-Eckart Bühler e Manfred Blank | Alemanha Ocidental | 1983, 119’, 16 mm para DCP restaurado (Museu de Cinema de Munique) Em sua fortaleza marítima, uma barcaça chamada Farol da Islândia estacionada perto da cidade francesa de Besançon, o ator semiaposentado representa seu último papel como protagonista. Embriagado, meio louco, ele conta suas histórias, suas ideias, conversa com uma equipe de filmagem que, salvo por alguns momentos, não se retrata para a câmera. O homem vive com os fantasmas de seu passado, incapaz de se perdoar por seus atos. "Meu mundo era o mar," ele diz, "e o mar é penoso." Os gestos repetitivos das mãos e da voz delatam a loucura, fruto do isolamento e da solidão. Os grandes escritores do mar, como Herman Melville e Robert Louis Stevenson, o acompanham, e passagens de livros são lidas como uma forma de passar o tempo. "Trata-se de um segundo nascimento." Assim ele descreve o momento atual da sua vida, no qual tenta escrever um livro sobre a sensação de descobrir os veleiros aos 12 anos e perceber a existência de um outro mundo. Com 65 anos, este ator norte-americano é Sterling Hayden, o emblemático navegador e herói de guerra que ajudou os comunistas iugoslavos durante a Segunda Guerra Mundial, e que, em 1951, denunciou seus colegas de Hollywood como comunistas para o Comitê de Atividades Antiamericanas (HUAC). Segundo a narração do documentário-retrato Farol do caos, os cinéfilos sempre identificaram Hayden com seu papel do ex-pistoleiro romântico em Johnny Guitar, o filme de Nicholas Ray que faz referência explícita àquele período de caça às bruxas e metamorfoseia a realidade em um faroeste. Mas, no momento das filmagens do documentário, quase 30 anos depois, Hayden se parece mais com o personagem do escritor alcoólatra no filme O perigoso adeus (The Long Goodbye, 1973), de Robert Altman: descalço, barbudo, solitário e angustiado, entrando e saindo de um estado de chocante lucidez. Farol do caos intercala imagens de arquivo e uma narração simples e direta sobre Hayden com as reflexões do ator. Os codiretores do filme, Wolf-Eckart Bühler e Manfred Blank, foram críticos de cinema para a importante revista alemã Filmkritik e colaboraram em uma série de documentários sobre artistas que entraram na Lista Negra da indústria cinematográfica norte-americana sob suspeita de serem comunistas. Eles estavam trabalhando em uma adaptação para o cinema do livro autobiográfico de Hayden, Wanderer [Viajante], de 1963, que aborda o período dos depoimentos do comitê até seu abandono de Hollywood no final da década de 1950, retornando ao mar. Ao encontrar com Hayden para pedir sua autorização para a adaptação cinematográfica (que virou o filme Der Havarist, de Bühler, em 1984), eles se deram conta de que havia um outro filme a ser feito naquele momento. Farol do caos serve, então, como um registro intenso da semana do encontro. Hayden faleceu de câncer de próstata três anos após o lançamento do filme no Festival Internacional de Cinema de Berlim. Blank teve uma longa carreira subsequente como crítico e cineasta, inclusive em colaboração com artistas como Harun Farocki, Merlyn Solakhan e Straub-Huillet. E Bühler, além de Der Havarist, fez dois filmes potentes sobre o legado da Guerra do Vietnã (Amerasia, de 1985, e Viet Nam!, de 1994) e se dedicou ao gênero de literatura de viagem. Farol do caos foi restaurado pelo Museu de Cinema de Munique em 2017 a partir dos seus negativos originais em 16 mm. Bühler e Blank fizeram duas versões do filme - uma com narração em inglês e a outra com narração em alemão. Pelo que se sabe, as exibições no IMS Paulista da versão em inglês marcam a estreia brasileira do filme. |
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